Imagina estar aguardando um terapeuta e ele chegar acompanhado de um simpático cãozinho, ambos prontos para ajudar. É assim que iniciam as atividades de Intervenções Assistidas por Cães do Programa Entrelaço, da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), campus Belém. O projeto, que realiza Intervenções Assistidas por animais (IAA) desde 2014, abriu inscrições para novas duplas cão-tutor, destinadas a auxiliar voluntariamente nas atividades desenvolvidas pelo Entrelaço. Para se inscrever, é necessário acessar o perfil do @entrelaco.ufra e preencher o formulário até o dia 09 de Abril. As fases da seleção serão informadas por e-mail e tem a parceria de alunos e professores do curso de psicologia do Centro Universitário Fibra.
“É importante lembrar que não estamos adestrando e nem treinando animais filhotes para atuar em intervenções. Nós selecionamos e preparamos duplas cão-tutor que tenham pendor para atuar no projeto. Entendemos que o tutor precisa estar presente no trabalho com esse cão, já que ele é a figura de segurança e apoio do cachorro, para que este fique confortável e possa se manifestar nas atividades e gerar ganhos para os usuários do trabalho. Na seleção, nós avaliamos desde aspectos relativos à saúde física e comportamento do cão, até a relação dele com o tutor. Não é um concurso, nossa preocupação é principalmente não causar qualquer dano ou prejuízo aos cães, pois temos um cuidado muito grande em preservar o bem-estar desse animal”, explica a professora Fernanda Martins, coordenadora do Entrelaço.
As duplas selecionadas irão atuar com quatro tipos de público do projeto, que serão os atendidos pelo Entrelaço em 2023 e 2024: crianças em idade escolar; alunos universitários; pessoas com deficiência; e pessoas em mitigação de danos pelo uso prejudicial de álcool e outras drogas, uma parceria da UFRA com Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) municipais de Belém.
A professora explica que o perfil do animal precisa ser considerado para que ele fique confortável em realizar essas atividades. “Cada público é atendido por no mínimo 12 semanas, até que se inicie outro trabalho, com outro público. O temperamento de cada animal precisa ser considerado para indicar o público com o qual ele deve atuar, ou seja, ele e o tutor vão ser encaixados acordo com o tipo de público que eles têm mais perfil e habilidade para atuar. Para cada tipo de atuação dessa, podemos ter animais diferentes, com personalidades diferentes. Ele precisa ser preparado porque precisamos que, para ele, as atividades sejam prazerosas e não estressantes”, diz a professora.
Lara também faz parte de um clubinho de goldens e sempre que tem oportunidade, Orlandina ajuda a divulgar o projeto, para conseguir mais voluntários entre os tutores. “O momento de leva-la nos atendimentos e reuniões do Entrelaço é programado e posso me organizar com antecedencia. Particpar do projeto e levar a Lara é algo que me faz muito bem, me preenche, porque eu mais ganho do que doo. A gente aprende tanto, me dá um orgulho tão grande de ver que a minha doação de tempo levando a Lara contribui para a evolução de alguém, de quem tá conhecendo ela. Eu “empresto” a Lara com toda satisfação, porque ela dá carinho, ela dá chamego, brinca. Fico muito feliz de ver a troca e a reciprocidade que acontecem. É como se tivessem fazendo pra mim, porque eu sei que ela gosta e fica feliz”, diz.
Benefícios
A ciência também explica como o combinado de focinhos e quatro patinhas tem influência direta no bem-estar humano, benefícios que não são apenas suposição de quem ama animais. “Cuidar dos cães e se sentir cuidado por eles é terapêutico para os humanos, assim como os cães, nós também somos animais sociais e precisamos de relações positivas e saudáveis. Os cães não julgam e estabelecem relações afetivas mesmo que você não seja bonito, bem vestido, não seja bem sucedido. E isso é muito importante. Com essa interação positiva, nós liberamos hormônios que são importantes para o nosso bem-estar, como ocitocina, endorfinas e outros. Tudo isso, bioquimicamente falando, nos torna mais saudáveis. Os trabalhos indicam que os cães melhoram a segurança das pessoas, a autoestima, e que ajudam em aspectos físicos, porque as pessoas precisam estar se movimentando e em atividade.”, explica a professora Fernanda Martins.
E o que faz um cão de intervenção? No último trabalho desenvolvido pelo projeto, os cães auxiliaram pessoas atendidas pelos CAPS. “A partir do estabelecimento de vínculos afetivos, foram realizados trabalhos voltados para o fortalecimento de autoestima e auxilio para a reinserção no mundo de trabalho, com relação a produtividade, já que são as áreas importantes para estas pessoas. Com isso, inserimos no planejamento atividades laborais com os animais, as pessoas aprendiam a dar banho, faziam caminhada controlada, adestramento básico, confecção de petiscos para alimentação dos cães. Como eles estavam apaixonados pelos cachorros, fazer coisas para os animais eram motivadoras. O trabalho culminou em uma visita a um pet shop, onde viram tudo isso de uma forma mais empresarial e um campo no qual poderiam atuar”, diz Fernanda Martins.
Intervenções Assistidas por Animais
A professora Fernanda Martins explica que o termo Intervenções assistidas por animais (IAA) abrange pelo menos três categorias distintas: as Terapias Assistidas por Animais (TAA), a Educação Assistida por Animais (EAA) e as Atividades Assistidas por Animais (AAA). “Na TAA participa uma equipe multidisciplinar composta por terapeutas, como fonoaudiólogos, psicólogos, fisioterapeutas, e cujos objetivos estão voltados para redução de danos em alguma dessas áreas da saúde. Na Educação, os objetivos estão voltados para a cognição, desenvolvimento educacional e por isso na equipe há parceria com pedagogos, psicopedagogos. Já nas atividades, as ações são voltadas para o lazer, para uma prática mais livre”, diz.
Embora o termo tenha se adaptado ao longo dos anos, o uso de animais no apoio e tratamento de doenças humanas não é uma atividade recente. Em 400 A.C, Hipócrates, considerado por muitos como o “pai da medicina”, já realizava intervenções com o uso de cavalos. Os registros existentes apontam que as intervenções com animais de companhia (cães e gatos) remontam desde o século XVII, em países europeus. Em 1969, o psiquiatra Boris Levinson começou a fazer pesquisas científicas sobre o assunto e, no Brasil, a pioneira é a médica psiquiatra Nise da Silveira. Ela estimulava o uso de práticas artísticas entre seus pacientes e incluiu a companhia de cães e gatos nas sessões, rejeitando a eletroconvulsoterapia e a lobotomia para pacientes com esquizofrenia.
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