Augusto Melo, 57, fez promessa à filha: será a última vez. A derradeira tentativa de ser presidente do Corinthians. Segundo colocado na eleição de 2020, ele perdeu para o atual mandatário, Duilio Monteiro Alves, por 145 votos de diferença em um universo de 2.873 sócios.
No pleito marcado para o final deste ano, ele é por enquanto o único nome da oposição para derrotar o grupo Renovação e Transparência, que ocupa o poder desde 2007.
"Minha família questionou [a opção de se candidatar]. Há pouco tempo, minha filha me perguntou por que a gente precisa disso. Eu pedi para ela me dar apenas este ano para tentar. É questão de honra", afirma o candidato.
Melo diz sofrer ameaças de morte. Ele anda com segurança e usa um carro diferente a cada semana, assegura. Registrou boletim de ocorrência e denuncia ligações e mensagens para ele e seus familiares em diferentes horários, até de madrugada.
Confessa ser este um sentimento estranho para quem passou anos a frequentar a sede social do clube apenas por causa dos jogos realizados no Canindé, área do Parque São Jorge onde ocorrem partidas internas.
"Nunca tive nada contra ninguém. Estou tendo inimigos agora, infelizmente, por causa da política. É horrível. Às vezes, você conhece uma pessoa que considera amiga e, porque está do outro lado na política do clube, passa a vê-la como inimiga. É decepcionante. Mas a gente tem um plano. Tenho certeza de que a minha é a única candidatura que pode tirar a gente dessa situação e vou tirar. Vai valer todo o risco", assegura.
"Essa situação" significa a dívida corintiana, que se aproxima de R$ 1 bilhão. Em campo, a equipe patina e não conquista título desde o Campeonato Paulista de 2019. Até a vitória sobre o Atlético Mineiro, no último sábado (8), aproximava-se da zona de rebaixamento do Brasileiro. O zagueiro Gil foi cobrado por torcedores em hotel, e o meia-atacante Luan, agredido por integrantes de organizada quando estava em um motel.
Melo também aposta no descontentamento do associado com os escassos investimentos de infraestrutura feitos por Duilio, acredita. O candidato da situação será André Luiz de Oliveira, conhecido como André Negão, um dos fundadores da Renovação e Transparência.
Há também o desgaste natural para o mesmo grupo político que tem mais de uma década e meia no poder. Para líderes da oposição, não há momento mais propício para obter vitória nas urnas. Embora a máquina e a capacidade de angariar votos de Andrés Sanchez, duas vezes presidente e nome maior da Renovação, sejam respeitadas.
A resposta de Melo foi manter-se em campanha desde a derrota nas urnas em 2020 e colocar-se como alternativa política. Segundo ele, isso fez com que passasse a receber seguidas provocações quando vai à sede social. Tudo para que reaja fisicamente, cometa uma agressão, seja denunciado e expulso do Corinthians.
Empresário do setor têxtil, ex-jogador de futsal e de campo, Melo chamou a atenção há três anos com uma proposta de colocar o alvinegro no "Guinness Book", o livro dos recordes, com a maior roda gigante do mundo, que seria instalada no Parque São Jorge. A proposta foi zombada por adversários, mas ele afirma: já tinha patrocinadores que bancariam a empreitada e renderia recursos ao clube, além de visibilidade.
Sobre dívidas, aumento de arrecadação e busca por marcas que invistam no clube, repete que o Corinthians é tão grande que "anda sozinho".
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"Tivemos em 2012 [ano do título mundial] a maior chance de o clube se expandir mundialmente e se tornar um dos maiores do mundo, o que eles mesmo [da Renovação e Transparência] projetavam. A marca é muito forte e tem condições para isso. Ganhou tudo. Mas, de lá para cá, eles fizeram o contrário. O Corinthians deixou de ser protagonista e cada vez mais estão manchando a nossa história", queixa-se.
Melo fez parte de administrações da Renovação e Transparência. Era diretor das categorias de base na presidência de Roberto de Andrade (2015-2018). Quando o mandatário esteve ameaçado de impeachment, em 2017, fez campanha pela reprovação do pedido no Conselho Deliberativo. Cita que, sob o seu comando, o departamento passou a ter jogadores como Pedrinho, Maycon, Pedro Henrique e Du Queiroz, entre outros.
Além das ameaças que afirma receber, ele convive com duas acusações. A de que seria empresário de jogadores e condenado por crime tributário. Não poderia, então, pleitear presidente do Corinthians.
O candidato da oposição nega ser agente. Diz ter trabalhado na União Barbarense para administrar o futebol por um curto período e que jamais foi responsável pela carreira de nenhum atleta. Está também, afirma, processando quem o acusou. Reconhece a condenação, declara ter sido herança de uma empresa que comprou no passado, mas decidiu pagar cestas básicas e cumprir trabalho social determinado pela Justiça.
Melo avalia que a sentença não o impede de ser mandatário e que não há nada no estatuto do Corinthians que proíba a candidatura.
"Sei que isso vai aparecer. Estou preparado porque vão jogar sujo."
Usando broche com o escudo do clube na lapela do terno e com tatuagem de Nossa Senhora Aparecida na mão direita, Augusto Melo jura estar pronto. Até para, em caso de rebaixamento, assumir a presidência com o Corinthians na Série B do Campeonato Brasileiro.
"Não acredito que vá acontecer. Mas a gente está preparado para tudo, entendeu?"
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